Aretha Duarte: primeira brasileira preta no topo do Evereste

Published: June 18, 2021, 11 p.m.

b'A escaladora da periferia de Campinas juntou dinheiro catando material reciclável para subir a montanha mais alta do mundo\\n \\n Um princ\\xedpio de edema pulmonar e queimaduras na retina foram os menores desafios de Aretha Duarte em sua jornada ao cume do Monte Evereste. Esses problemas surgiram apenas durante a escalada, que terminou no dia 23 de maio, a transformando na primeira mulher preta latino-americana a conquistar a montanha mais alta do mundo (8.849 metros de altura).\\n[VIDEO=https://www.youtube.com/embed/qxkYR1TP3zo; CREDITS=; LEGEND=; IMAGE=https://img.youtube.com/vi/qxkYR1TP3zo/sddefault.jpg]\\nObst\\xe1culos muito mais severos vieram antes, como os 400 mil reais necess\\xe1rios para a viagem. Nascida na periferia de Campinas, Aretha se voltou a uma atividade que conhece desde crian\\xe7a e a qual sempre recorreu quando precisou de dinheiro: a cata\\xe7\\xe3o de res\\xedduos recicl\\xe1veis. \\xc0 medida que pessoas e empresas se solidarizavam com a campanha que recebeu o nome de Aretha no Evereste, mais aumentava a rota da atleta em busca de latinhas, pl\\xe1sticos, papel\\xf5es e outros materiais. Com uma caminhonete usada, tudo era recolhido e vendido em at\\xe9 oito rotas ao ferro velho por dia. E em pouco mais de um ano o esfor\\xe7o rendeu 35% do valor necess\\xe1rio para a aventura. O restante veio das economias no trabalho como guia em uma ag\\xeancia de aventuras, a Grade 6, tamb\\xe9m de Campinas, e de patrocinadores que aos poucos foram surgindo, sugados pela determina\\xe7\\xe3o da montanhista. "O Evereste \\xe9 s\\xf3 uma parte do meu objetivo, que \\xe9 socioambiental", diz j\\xe1 sonhando em levar paredes de escalada \\xe0 bairros pobres como o seu.\\nOutra barreira foi a da representatividade. O primeiro homem a chegar ao cume do Evereste foi o neozeland\\xeas Edmund Percival Hillary, em 1953. Foram precisos outros 22 anos para a japonesa Junko Tabei se tornar a primeira mulher a realizar o feito, em 1975. A primeira mulher negra, Sophia Danenberg, chegaria apenas em 2006. E a primeira mulher negra latino-americana foi Aretha, naquele domingo de maio.\\nEm entrevista ao Trip FM, ela conta detalhes da escalada, fala sobre a dura rotina de treinos e revela o que almeja para o futuro. Ou\\xe7a o programa no Spotify, no play abaixo ou leia um trecho da entrevista a seguir.\\n[AUDIO=https://p.audio.uol.com.br/trip/2021/6/Aretha_podcast.mp3; IMAGE=https://revistatrip.uol.com.br/upload/2021/06/60ccbd44326a1/aretha-duarte-montanhista-everest-trip-mh2.jpg]\\nTrip. Aretha, vi que sua m\\xe3e conta uma hist\\xf3ria sobre como voc\\xea comprou seus patins, quando crian\\xe7a, vendendo latinhas para reciclagem. Conta mais um pouco da sua origem, da sua fam\\xedlia.\\nAretha Duarte. Minha m\\xe3e \\xe9 refer\\xeancia de garra e determina\\xe7\\xe3o. A mulher que mais amo. A minha m\\xe3e e seus irm\\xe3os vieram de Pernambuco buscando melhores oportunidades profissionais. Eu sempre fui \\xe0 escola, escola p\\xfablica, mas tive acesso \\xe0 educa\\xe7\\xe3o. E tinha sociabiliza\\xe7\\xe3o tamb\\xe9m: na periferia onde moro a gente tem muito contato, muita rela\\xe7\\xe3o acontecendo na rua. Eu n\\xe3o senti falta de nada, a minha inf\\xe2ncia foi maravilhosa. Isso foi garantido pelo meu pai e minha m\\xe3e. Sou ca\\xe7ula de tr\\xeas irm\\xe3os e n\\xf3s todos sentimos isso.\\nComo foi essa hist\\xf3ria de catar recicl\\xe1vel? \\xc9 dif\\xedcil at\\xe9 imaginar, porque pelo que a gente sabe, o material recicl\\xe1vel gera muito pouco dinheiro para conseguir levantar esse or\\xe7amento de 400 mil reais.\\xa0Trabalhar com recicl\\xe1vel me pareceu uma escolha muito simples, ainda mais no momento de pandemia, no qual as op\\xe7\\xf5es eram poucas. Se a gente pensa em um volume pequeno, realmente \\xe9 dif\\xedcil imaginar conseguir juntar esse dinheiro todo. Mas foi juntando recicl\\xe1vel que eu consegui aproximadamente 110 mil reais do or\\xe7amento total. Foram 130 toneladas ao final. Assim que eu estabeleci que iria escalar o Evereste comecei a espalhar o projeto. As pessoas foram se engajando. As empresas entraram tamb\\xe9m; nelas o volume era bem maior. Todos os dias depois de decidir fazer a escalada eu trabalhei.\\n[IMAGE=https://revistatrip.uol.com.br/upload/2021/06/60ccbd5c2996c/aretha-duarte-montanhista-everest-trip-mq.jpg; CREDITS=Gabriel Tarso; LEGEND=Aretha Duarte em sua jornada ao cume do Monte Evereste; ALT_TEXT=Aretha Duarte em sua jornada ao cume do Monte Evereste]\\nO que \\xe9 que dava for\\xe7a a voc\\xea durante os maiores perrengues da escalada? O que voc\\xea mais ficava com saudade da sua vida cotidiana, das pequenas coisas?\\xa0Por ser uma expedi\\xe7\\xe3o muito longa, a probabilidade de surgirem adversidades \\xe9 muito grande. Eu pedi a minha m\\xe3e para me levar uma marmita no dia da chegada com o arroz da minha av\\xf3, chuchu refogado e bacon \\u2013 era o que mais sentia falta. A gente come o mesmo card\\xe1pio todos os dias na montanha. Quando tive in\\xedcio de edema pulmonar ou queimadura de retina, pensava que talvez n\\xe3o desse para terminar a escalada, mas logo lembrava que a conquista j\\xe1 n\\xe3o era mais minha. Eu lembrava de uma legi\\xe3o de pessoas pretas querendo que eu chegasse. Minha fam\\xedlia de pernambucanos desejando o meu sucesso. Lembrava dos doze meses carregando quinhentos quilos de material recicl\\xe1vel todos os dias para tornar isso realidade. Foi essa minha cren\\xe7a que me fez, no dia de ataque ao cume, sentir-me como a pessoa mais forte do mundo, ao ponto de convencer o meu guia a continuar, no momento em que ele sentiu frio e pediu para voltar. Naquele momento senti que a minha tentativa estava frustrada e chorei. Aos prantos, pedi para subir, mas que se ele tivesse que ficar doente, a gente voltava. Ele enxugou minhas l\\xe1grimas, colocou minha viseira, minha m\\xe1scara de respira\\xe7\\xe3o e fomos em frente, mais oito horas de caminhada.\\xa0\\n[IMAGE=https://revistatrip.uol.com.br/upload/2021/06/60ccbde8662b1/aretha-duarte-montanhista-everest-trip-mh1.jpg; CREDITS=Jennifer Amaral; LEGEND="O Evereste \\xe9 s\\xf3 uma parte do meu objetivo, que \\xe9 socioambiental", diz j\\xe1 sonhando em levar paredes de escalada \\xe0 bairros pobres como o seu; ALT_TEXT=Aretha Duarte]'