Andreas Kisser: Precisamos falar da morte

Published: Feb. 9, 2024, 11 p.m.

b'Guitarrista do Sepultura fala da turnê de despedida da banda, sobre a perda da esposa Patrícia e da relação com o álcool\\n \\n Ap\\xf3s quatro d\\xe9cadas na estrada, a lend\\xe1ria banda Sepultura est\\xe1 se preparando para encerrar sua jornada. Marcada por ser a primeira grande banda brasileira a conquistar reconhecimento internacional (bem antes de Anitta, eles j\\xe1 colecionavam pr\\xeamios no MTV Music Awards), o grupo se despedir\\xe1 dos f\\xe3s em grande estilo. O renomado guitarrista e m\\xfasico globalmente aclamado, Andreas Kisser, compartilhou detalhes dessa despedida em uma conversa emocionante com o Trip FM.\\n[IMAGE=https://revistatrip.uol.com.br/upload/2024/02/65c66db35aad3/andreas-kisser-sepultura-rock-artista-tripfm-mh.jpg; CREDITS=Bob Wolfenson; LEGEND=A banda Sepultura; ALT_TEXT=Sepultura]\\n"N\\xe3o foram um ou dois os sinais para encerrar o Sepultura\'\', conta Andreas.\\xa0Num papo sobre o ato de "deixar morrer", ele refletiu sobre a s\\xe9rie de eventos que o conduziram a esse momento. Um dos principais foi a perda de sua esposa de mais de 30 anos, Patr\\xedcia Kisser, que faleceu em 2022 ap\\xf3s uma batalha contra o c\\xe2ncer. "N\\xe3o foram apenas um ou dois os motivos para encerrar o Sepultura. O confronto com a finitude, a perda da minha esposa Patr\\xedcia e todo o trabalho subsequente para abordar a quest\\xe3o da morte no Brasil foram alguns deles. Senti-me totalmente despreparado, como cidad\\xe3o, para lidar com isso: despreparado para dialogar com m\\xe9dicos, compreender os cuidados paliativos e diversos outros aspectos. Por que n\\xe3o se discute eutan\\xe1sia no Brasil? Estou aprendendo tanto com a morte da Patr\\xedcia quanto aprendi em sua vida. Um filme sem fim n\\xe3o faz sentido. E por que n\\xe3o encarar o fim do Sepultura dessa mesma maneira? S\\xf3 temos a ganhar com essa abordagem", diz.\\nAndreas tamb\\xe9m falou sobre sua decis\\xe3o de abandonar o consumo de \\xe1lcool, sobre o S\\xe3o Paulo Futebol Clube, do movimento Matricia, em homenagem \\xe0 esposa, deu recomenda\\xe7\\xf5es de bandas e muito mais. A entrevista completa est\\xe1 dispon\\xedvel aqui no site da Trip e no Spotify.\\xa0\\nTrip FM. Voc\\xea sempre esteve aberto a colaborar com qualquer artista. J\\xe1 recebeu cr\\xedticas do universo do metal por isso?\\nAndreas Kisser. Conhecer os artistas por tr\\xe1s da m\\xfasica, com todas as suas fraquezas, me ensinou muito sobre essa profiss\\xe3o, que n\\xe3o \\xe9 f\\xe1cil. O artista sobe no palco de peito aberto, numa posi\\xe7\\xe3o muito fr\\xe1gil. \\xc9 preciso estar preparado, saber quem voc\\xea \\xe9. \\xc9 a ess\\xeancia da m\\xfasica. Toquei com a Ivete no ano passado e ouvi muitas cr\\xedticas. Fiquei surpreso que em 2024 as pessoas ainda estejam presas a esse tipo de limite.\\nTem sido dif\\xedcil a decis\\xe3o de encerrar o Sepultura?\\xa0N\\xe3o foram um ou dois os sinais para encerrar o Sepultura. O contato com a finitude, a passagem da minha esposa Patr\\xedcia e todo o trabalho que se seguiu para conseguir falar sobre morte aqui no Brasil foi um desses sinais. Me senti muito despreparada como um cidad\\xe3o ao passar por isso: despreparado para falar com m\\xe9dicos, para entender os cuidados paliativos e muitos outros aspectos. Por que n\\xe3o se fala de eutan\\xe1sia no Brasil? De testamento vital? Fiquei sabendo de coisas que me deixaram chocado. N\\xe3o existe cuidado paliativo na maioria dos hospitais do pa\\xeds. N\\xe3o faz parte nem do curr\\xedculo na faculdade. Eu estou aprendendo com a morte da Patr\\xedcia tanto quanto aprendi em vida com ela. A maneira como ela encarou, como deixou as coisas preparadas. Quando aconteceu todo mundo sabia o que ela queria. Precisamos falar de morte, morte \\xe9 limite e limite \\xe9 educa\\xe7\\xe3o. Um filme sem fim n\\xe3o tem sentido. Tem que ter um encerramento, s\\xf3 h\\xe1 sentido com fim. E por que n\\xe3o encarar o fim do Sepultura dessa forma? A gente s\\xf3 tem a ganhar.\\nO que mais voc\\xea aprendeu com a Patr\\xedcia?\\xa0A n\\xe3o acreditar muito nesse mito da guitarra, do palco, na forma como as pessoas enxergam voc\\xea. \\xc9 perigoso esquecer de onde voc\\xea veio. \\xc9 importante sempre lembrar do motivo de estar aqui, de quando eu estava ensaiando no quarto de casa imaginando viajar, tocar com o Ozzy. Conquistei todos os meus sonhos e muito mais. Eu amo guitarra, eu amo m\\xfasica.\\nOutro novo ciclo que se inaugurou na sua vida foi na rela\\xe7\\xe3o com o \\xe1lcool?\\xa0A melhor coisa que fiz na minha vida foi ter largado o \\xe1lcool. Al\\xe9m da sa\\xfade, de desinchar, de economizar dinheiro, o mundo \\xe9 outro. Para mim o mundo antes era bar. Entrava no aeroporto, bar; no avi\\xe3o, cerveja; futebol, vamos beber; churrasco no fim de semana, beber; t\\xf4 puto, vou tomar uma; t\\xf4 feliz, vou tomar uma. O \\xe1lcool fazia todas as minhas escolhas: qual restaurante, quais f\\xe9rias, tudo. Eu n\\xe3o fui na Disney com a minha fam\\xedlia porque n\\xe3o tinha cerveja. E n\\xe3o percebia. A Patr\\xedcia falava que eu era um Playmobil com a latinha encaixada na m\\xe3o. E nunca fui alco\\xf3latra de beber todo dia, mas tudo tinha o \\xe1lcool. A partir do momento em que essa ficha caiu, percebi que eu era um imbecil. Saiu uma nuvem negra de cima de mim. Comecei a meditar, fazer pilates, estudar mais viol\\xe3o, tomar banho de gelo. Enfrentar uma pandemia, perder minha esposa, reconstruir a minha vida com meus filhos\\u2026 Tudo foi melhor sem o \\xe1lcool.'